21 de abril de 2014

O importante é não perder a compostura

No fim-de-semana passado fui a um baptizado e levei uns sapatos de salto que, não sendo muito altos, a meio da tarde já me provocavam um desconforto tal que nem conseguia descer escadas sem parecer uma atrasada mental.
Foi assim, nesta tormenta, que levei a Alice ao piso inferior para lhe mudar a fralda. Sem elevador, as escadas de acesso eram bastante íngremes para o meu sapatinho de donzela e, muito pouco habituada a estas andanças, comecei a descer as escadas uma a uma, tentando equilibrar-me com a bebé meio deitada num braço e o fraldário na outra mão. Lá em baixo vinha uma outra mãe, daquelas que fica logo linda e vaporosa depois de sair da maternidade, com um corte de cabelo todo fashion e óculos escuros à diva, a subir as escadas tal qual uma pluma de pavão (já tinha reparado nela e proferido interiormente uns quantos nomes feios).
Ora eu, que gosto pouco de fazer figura de anormal, achei que não lhe iria ficar atrás, mesmo que não me tivesse penteado para o evento, muito menos aquela coisa do vaporoso, e resolvi descer também eu as escadas qual pluma no ar, leve como uma donzela e sem ter de olhar para baixo porque "saltos é o meu nome do meio"!
Esqueci-me foi que levava uma bebé nos braços e que as escadas tinham um corrimão à altura do meu cotovelo. Na verdade, eu não me esqueci. Na verdade, eu suava por dentro a tentar equilibrar-me sem deixar cair nada, fraldas ou bebé, mas tão focada em não deixar cair nada acabei por me esquecer de afastar a cabeça da Alice da parede.
E foi então que o inevitável aconteceu. Ao dar balanço para descer as escadas sem parecer uma anormal  (percebo agora que não me saí bem), dei com a cabeça da Alice no corrimão. 

Esta é a parte em que vocês esperam que eu diga que parei imediatamente de descer, examinei a cabeça da piquena e a acalmei, alheia a tudo o resto. A história acabava aqui com uma boa lição de moral, certo? 
Errado.

Houve aqueles dois segundos de espera entre bater com a cabeça e começar a chorar. Foram dois segundos de profunda esperança. Esperança de que ela não se tivesse aleijado a sério, mas, principalmente, que ninguém tivesse dado por nada, sobretudo a lambisgóia de penteado fashion! Foram dois segundos em que ainda consegui descer mais um degrau como se nada fosse, a tentar equilibrar-me sem deixar cair nada e a cerrar os dentes com aquele sorriso amarelo não-se-passa-nada.

A lambisgóia, provavelmente, não devia estar a acreditar na negligência que acabara de testemunhar, pois ainda parou a meio das escadas, talvez com a intenção de me avisar "Olhe que a sua bebé bateu com a cabeça...". Mas eu, como se nada fosse, achei por bem nem dar pela sua presença e fingir-me surpreendida quando a Alice, por fim, abriu a goela. 
- Oh, bebé, o que foi bebé? Tem a fraldinha cheia, tem?

A lambisgóia seguiu caminho e eu, quando cheguei lá abaixo, ainda encontrei uma amiga à porta da casa-de-banho a quem confidenciei, com o ar mais natural do mundo:

- Nem sabes, acho que acabei de dar com a cabeça da Alice no corrimão...




* Para que conste, está tudo bem com a Alice. E, até a lambisgóia se ir embora com o seu rebento-capa-de-revista, fui muito bem-sucedida em escapar-me da sua vista.

4 comentários: