9 de janeiro de 2014

Os velhos jarretas

Deixei a bebé no espaço infantil proporcionado pelo ginásio e fui à minha vida. A educadora parecera-me pessoa séria e competente, incapaz de fugir com os filhos dos outros e dotada de suficiente experiência e bom-senso para não se alarmar à vista de um ser humano com tão pouco tempo de vida. Na rua, no supermercado, no centro comercial, as pessoas, normalmente as de cabelo grisalho, costumam parar-me e obrigar-me a esperar que acabem de admirar "a encomendinha", ai que coisa tão rica, benza-a Deus, quantos meses tem, e ficam sempre muito espantados quando lhes digo que ainda só tem 6 semanas. Depois olham para mim, com aquele ar aflito, e perguntam se já são semanas suficientes para vir à rua. Aprendi a ignorar. A sorrir amavelmente e seguir o meu caminho. A maior parte das vezes já nem respondo, agradeço as felicidades e faço-me à vida, que é minha e por isso posso fazer-me a ela como bem entender. Imagine-se, então, se uma dessas pessoas me encontrasse no espaço infantil do ginásio, deixando a minha filha entregue a uma estranha, com tão pouco tempo de vida, ele há gente muito irresponsável, francamente.

No balneário deparar-me-ei também com dois velhos, mas o assunto, esse, já será outro, como veremos.

Entrei, como habitualmente, no balneário que dá acesso às piscinas. Estranhei estar tão vazio, tão despojado de sapatos por baixo dos bancos e cacifos sem cadeados. Ainda voltei atrás e confirmei, é este o balneário feminino de acesso à piscina, não o outro, novo das obras, catita como que saído das páginas de uma revista de decoração, que pelo outro não há passagem de acesso, só pode ser este, pelo outro teria de passar em fato de banho pelos homens das obras, valha-me Deus, só pode ser este. Entrei.

Tinha acabado de despir as cuecas e posto a parte de baixo do fato de banho quando oiço passos de chinelo e vozes masculinas que se aproximavam, oriundas da piscina, mas que raio, parece que vão entrar aqui, e apressei-me a vestir o fato de banho todo, já que tirar o soutien daria menos trabalho do que voltar a vestir as calças. Caem-me os discos de amamentação e eu, cada vez mais atrapalhada e descoordenada com a proximidade das vozes, lá me contorço e consigo colocar a última alça do fato de banho no preciso momento em que dois velhos sobranceiros entram no balneário, estacando de seguida perante a minha figura e atrapalhação. Ah..., dizemos todos quase ao mesmo tempo. Os velhos, jarretas como já se veria, de barrigas proeminentes, cabelo ralo colado à cabeça e touca a resvalar já quase só a tapar o cocuruto, apressam-se a dizer-me que estava mal ali, que o balneário feminino agora era o outro, o novo, o catita, que agora aquele servia à piscina e por ali passariam todos, velhos, novos e assim-assim, mas, abre aspas, que eu não me importasse porque estava muito bem, sim senhora, o fato de banho assentava-me bem, e não tinha nada com que me envergonhar, mas o que se sobressaía mais em mim era mesmo o cabelo, não é nada, são os olhos, gritou o outro, já desaparecendo pela porta. Fecha aspas.

E eu fiquei ali, galanteada mas sem me sentir como tal, de touca na mão, a pensar que afinal tinha mesmo de passar em fato de banho pelos homens das obras e ainda ponderei voltar-me a vestir, ir buscar a gaiata e adiar a natação, mas afinal quem já pariu duas filhas também é capaz de passar em fato de banho pelos homens das obras, posto o que meti a touca à vergonha e caguei de alto.

O resto da tarde decorreria sem incidentes de maior.

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