12 de setembro de 2014

Viver no campo


Costumo dizer que vim viver para o campo, mas é só para me armar. Isto não é campo. Campo, para mim que nunca vivi no campo, é viver numa casa com uma árvore com baloiço, couves no quintal de trás, roupa a secar na corda, 3 ou 4 cães a guardar a propriedade, uma seara a perder de vista e bicharocos a saltitar por todo o lado. A casa mais próxima ficaria a, pelo menos, 3 km de distância e o único estabelecimento comercial de grandes dimensões seria o da vila, a 15 km.

Ora, entre isso e o sítio onde vivo agora há algumas semelhanças, é certo, como a roupa a secar na corda e os bicharocos que, volta e meia, dão um ar da sua graça, mas as diferenças são mais que muitas. Por exemplo, em vez de couves no quintal há alfaces na varanda. Não há searas a perder de vista, mas há a Arrábida como pano de fundo e um relvado onde nos deitamos numa mantinha com o cheiro no ar da relva acabada de cortar. Não há árvores com baloiço, mas há um limoeiro e uma laranjeira que vão deixando cair frutos em cima das nossas cabeças quando vamos à garagem. A casa mais próxima fica a 50 metros e os cães são substituídos por gatos que não guardam coisa nenhuma, mas trazem pulgas para casa como oferenda de amizade. Ainda por cima são todos iguais uns aos outros e difíceis de distinguir como o raio (em contrapartida, têm nomes muito nobres como Pompeu, Teresinha, Elvirinha... e um dia ainda vos falo do galo Sansão que cá viveu em tempos). À nossa porta passam os miúdos a caminho da escola e ao fundo da rua há mais centros de explicações do que cafés em todo o lugarejo. Portanto, animação é o que não falta.

Mas gosto de dizer que vim morar para o campo. Porque na cidade a minha filha não acorda intrigada com o galo da vizinha que canta tão cedo. Na cidade não podemos fazer o jantar com a porta das traseiras aberta. Na cidade as pessoas na rua não têm um sotaque meio alentejanado e o carteiro não apita à porta de casa para me entregar uma encomenda. Na cidade a piscina para a miúda não custa só doze euros por mês. Na cidade o meu gato não espera por mim ao portão do quintal. Na cidade não vejo borboletas aos pares quando vou a pé ao café, nem caracoletas a namorar no vaso do cebolinho.
Não cidade não há nada disto. Há outras coisas, é certo, mas tenho cá para mim que na grande cidade o Baltazar e a Blimunda eram capazes de durar pouco. Estou a falar aqui dos moluscos, é claro.

Sem comentários:

Enviar um comentário